ORDO AB CHAO!
Muito já se tem escrito e discutido
acerca dos Landmarks na Maçonaria.
Estudiosos há que, pretensamente, os
consideram os princípios fundamentais da nossa Instituição, ainda que
sua origem se perca na poeira dos tempos e não tenha sido obra de
nenhum legislador.
Como refere Nicola Aslan (Landmarks e
outros problemas maçônicos - Estudos, p. 13), "a idéia geral que
se tem sobre os Landmarks, na Maçonaria, é que são usos, costumes,
leis e regulamentos universalmente reconhecidos, existentes desde tempos
imemoriais, fundamentais princípios da Ordem, inalteráveis e irrevogáveis,
e que não podem ser infringidos ou desviados o mais levemente que seja.
Tão remotos seriam eles de não se lhes poder determinar a origem, e tão
essenciais que, se fossem alterados, modificados ou emendados, também
estaria mudado o próprio caráter da Maçonaria".
Etimologicamente, a expressão deriva
da palavra inglesa landmark, composta de land - terra, solo, terreno, e
mark — limite, marco. Como assinala Aslan (op. cit., p. 15), “...
significa, pois, marca na terra para ser utilizada como ponto de referência,
e mais, limite, linde, marco, lindeiro, fronteira, raia, termo, ponto
divisório, baliza, confim, estaca, etc. Mas em literatura maçônica, o
vocábulo tem o sen1ido de regra ou norma".
Afirma ainda que, como tantas outras,
a idéia dos Landmarks veio da Bíblia, o que não deve causas
estranheza, de vez que "a partir do momento em que os ingleses se
afastaram do domínio religioso de Roma, as Sagradas Escrituras se
tornaram o livro de cabeceira daquele povo”. E de fato, vários versículos
da Bíblia referem-se a marcos e limites. “Há os que removem os
limites” (Jó, 24, 2); “Não removas os marcos antigos que puseram
teus pais” (Provérbios, 22, 28); “Maldito aquele que mudará os
marcos de seu próximo” (Deuteronômio, 27, 17). (Nicola Aslan,
ibidem).
É oportuno mencionar-se que Anderson,
a quem se atribui a sistematização da Constituição de 1723, era
pastor. A propósito, Christian Jacq (A Franco-Maçonaria — História
e Iniciação, p. 15), afirma que dois homens representaram importante
papel na elaboração das constituições surgidas em 1723: o pastor
Jean Théophile Désaguliers (1683-17??) e o pastor Anderson
(1684-1739).
Isso evidencia que a polêmica
ultrapassa os limites dos Landmarks propriamente ditos, estando presente
até na definição da autoria da Constituição de Anderson, de 1723.
Sobre o assunto, diz Christian Jacq (ibidem, p. 16), “... predominam
três teorias: Anderson é o único autor; Désaguliers é o verdadeiro
autor e Anderson o zeloso redator; um comitê de quatorze maçons
indicou as idéias principais que Anderson pôs em forma".
Jacq acrescenta que, segundo notas do
próprio Anderson, “... irmãos cheios de escrúpulo queimaram
demasiado precipitadamente vários manuscritos de valor referentes à
Fraternidade, às Lojas, aos Regulamentos, Obrigações, Segredos e
Costumes, para que esses papéis não caíssem entre as mãos dos
profanos “. “A justificativa é um tanto fraca!” — prossegue
Jacq. “Essa revelação nos informa em termos claros que as
‘constituições’ autênticas foram simplesmente destruídas para
que ninguém, no futuro, pudesse estabelecer comparações
significativas. Destruição ingênua parece, pois as antigas regras de
vida dos maçons foram, em parte, encontradas”.
Importante ressaltar que, apesar da
confusão e da polêmica acerca da Constituição de Anderson, é
absolutamente evidente a sua preocupação em estabelecer uma posição
política para a Maçonaria, como se pode verificar no preceito que
trata da Autoridade Civil, superior e inferior, que diz textualmente:
"O maçom deve ser pessoa pacífica, submeter-se às leis do país,
onde estiver e não deve tomar parte, nem se deixar arrastar nos motins
ou conspirações deflagrados contra a paz e a prosperidade do
povo". "Nem se mostrar rebelde à autoridade inferior, porque
a guerra, o derramamento de sangue e as perturbações da ordem, têm
sido sempre funestos para a Maçonaria". "Assim é que, na
antiguidade, os reis e príncipes se mostraram muito dispostos para com
a sociedade, pela submissão e fidelidade de que os maçons deram
constantes provas no cumprimento de seus deveres de cidadão e em sua
firmeza em opor sua conduta digna a caluniosas acusações de seus
adversários. Esses mesmos reis e príncipes não se recusaram a
proteger os membros da Corporação e defender a integridade da mesma,
que sempre prosperou em tempo de paz. Segundo estas doutrinas, se algum
Irmão se convertia em um perturbador da ordem pública, ninguém devia
ajudá-lo na realização de seus propostos e pelo contrario devia ser
compadecido por ser um desgraçado. Mas por este fato, e ainda que a
Confraria condenasse sua rebelião, para se evitar dar ao governo motivo
de alguma suspeita ou de descontentamento, sempre que o rebelado não
pudesse ser censurado por outro crime, não podia ser excluído da Loja,
permanecendo invioláveis suas relações com esta, bem como os direitos
de que como maçom gozava”.
Entendemos que este preceito, mesmo
com as características de um landmark, não é assim tão inflexível,
eis que admite — em nome, talvez, da tolerância —, a rebeldia do
Irmão, inclusive acobertando seu “deslize”, embora o rotulando de
“desgraçado”.
Ou então, o que nos parece mais
consentâneo com a realidade, traz ele implícita a idéia de que o maçom
“é um homem livre, fiel às leis, amigo dos governantes, quando eles
são virtuosos”, não admitindo viver sob a opressão de um governo
despótico ou tirânico".
“Por aí se vê — destaca João César
(Maçonaria e Política. 1956. p. 98) —o caráter eminentemente político
da Constituição de Anderson. Enquanto havia necessidade de a Maçonaria
servir aos adeptos das concepções democráticas e liberais de
Cromwell, essa Constituição não encontrava ambiência. E só teve a
aceitação que granjeou imediatamente porque ia servir, politicamente,
ao poder constituído, interessado na submissão” de tão poderosa
organização “.
No entanto, João César (op. cit. pp.
97/98), destaca também que “Anderson, ministro cristão do Evangelho,
deu cunho de religiosidade à Ordem e aboliu o caráter cristão até
então predominante, ampliando a concepção do ser supremo, que passou
a situar-se acima de qualquer crença”.
Bernar E. Jones, em seu Guia e Compêndio
do Franco-Maçom (Freemason’s Cuide and Compendium, p. 334), refere
uma definição de John W. Simons (Principies of Masonic Jurisprudence
— Princípios de Jurisprudência Maçônica), que estabelece:
“São considerados Landmarks as regras de conduta que existem desde
tempos imemoriais — seja sob a forma de lei escrita ou não escrita
— que são co-essenciais à Sociedade (maçônica) que, na opinião da
maioria, são imutáveis, e que todo maçom é obrigado a manter
intactas, em virtude dos mais solenes e invioláveis compromissos“.
Daí os princípios:
de que um Landmark é irreformável
perpetuamente;
• de que nenhum novo Landmark pode ser criado;
• de que, teoricamente, poderia, contudo, ser explicitado;
• de que, mesmo que se concebesse a possibilidade de se reunir em uma
convenção mundial, todos os francos-maçons regulares do planeta, e
que mesmo que essa convenção emitisse um voto unânime, ele seria
detido pelas regras acima citadas;
• de que um Landmark não é nenhum símbolo, nem uma alegoria, mas
uma regra;
• de que não é, contudo, um dogma, pois é de origem humana;
• de que qualquer um que discorde dessas máximas, sai ipso facto da
verdade maçônica.
Como já vimos, na Maçonaria a idéia
de Landmark tem um sentido próprio, assumindo a característica de lei,
mandamento, norma de conduta e organização.
Uma das particularidades da norma, da
lei, é a de trazer consigo um sentido de coação, de constrangimento,
e que representa a possibilidade de ser obedecida.
Aliás, esta coação tem duplo
sentido: primeiro, quanto ao aspecto psicológico — saber
antecipadamente que a transgressão pode redundar em pena, castigo, punição;
por fim, após a transgressão, a aplicação da sanção, da punição
propriamente dita. De qualquer forma, admite-se que o indivíduo,
exercitando seu livre arbítrio, obedeça ou não, arcando, contudo, com
as conseqüências de seu ato.
CONTEXTO HISTÓRICO
É nos Regulamentos Gerais de George Payne, de 1720, que se encontra a
primeira referência ao vocábulo “Landmark”. Ali, o artigo 39
estabelece: “Cada Grande Loja anual tem inerente poder e autoridade
para modificar este Regulamento ou redigir um novo em benefício desta
Fraternidade, contanto que sejam mantidos invariáveis os antigos
Landmarks...“ Como aponta Nicola Aslan (ibidem, p. 16), “... a
Assembléia Geral celebrada a 25 de novembro de 1723, pela Grande Loja
da Inglaterra, substituiu a palavra “landmark” pela de “rule“,
regra, e incorporou o texto dos Regulamentos Gerais de Payne no Livro
das Constituições de Anderson, na edição de 1738”. E a expressão
“rule” continuou a ser empregada nas edições posteriores, de 1756,
1767 e 1784.
No entender de João César (op. cit.
p. 97), “A Constituição de Anderson, promulgada em 1723, é o marco
que assinala a transformação da Maçonaria de Operativa em
Especulativa, embora já existisse, muitos anos antes, a Maçonaria Simbólica,
ou melhor, a adoção dos “Maçons Aceitos” ou “Maçons Adotados
“.
De maneira nenhuma se pode deixar de levar em consideração o contexto
histórico em que as Constituições foram elaboradas e a que tipo de
interesses serviram. E importante lembrarmos que, à época, vivia-se a
“idade das Luzes”, sendo natural que, depois do obscurantismo
medieval, as idéias iluministas influenciassem sobremaneira a ambiência
cultural e o pensamento. Uma das principais características da época
diz respeito à valorização e à busca da razão das coisas.
Na Inglaterra do século XVI, era
evidente a luta pelo poder entre uma classe social ascendente — a
burguesia — e a nobreza. A arma principal da burguesia é o controle
econômico, que determina, em contrapartida, o controle das idéias e
valores, abrindo os horizontes do mundo, estimulando as ciências,
opondo-se aos dogmas religiosos, destruindo a objetividade medieval e
criando caracteres libertadores, novas significações, novos ares sobre
o mundo “velho” e parado.
A história registra que, no século
XVI, após o rompimento com o Papado, efetivado por Henrique VIII
(fundador da Dinastia dos Tudor), e a fundação da religião anglicana
por sua filha, Elizabeth I, a Inglaterra, sob o longo reinado da
soberana (1558-1 603), conhece um período de apogeu cultural e político,
transformando-se em potência marítima e iniciando uma expansão
colonialista.
De 1642 a 1649, a Inglaterra se
defronta com uma guerra civil, que culmina com a decapitação do rei
Carlos I (da Dinastia dos Stuarts), que queria governar sem parlamento.
Inicia-se, então, um período de nove anos de ditadura militar de
Oliver Cromnwell, que proclama a República. Contudo, em 1660, é
restaurada a Monarquia, com o trono sendo entregue a Carlos II. Em 1707,
Inglaterra, Escócia, Irlanda e País de Gales formam a Grã-Bretanha,
ou Reino Unido. Com o afastamento dos Stuart, em 1714, a Dinastia dos
Hannover se instala no trono, ocupando-o até hoje. Nos anos que se
seguem, a Inglaterra consolida seu império colonial, principalmente na
Índia e América do Norte.
Bastante significativa a circunstância
de que a Inglaterra, durante o período em que esteve sob o governo do
puritano Cromwell, haver conhecido sua única Constituição escrita: o
“Instrument of Government”. Também singular mostra-se o fato de os
puritanos, que deixavam a Inglaterra para livremente celebrarem seu
culto em terras do Novo Mundo, haverem redigido, ainda a bordo do
“Mayflower”, o documento político que haveria de estruturar a forma
de organização constitucional das futuras colônias inglesas.
Entendemos que a fixação dos
Landmarks pela Maçonaria anglo-saxã servia, fundamentalmente, á intenção
de serem garantidos seus interesses, especialmente quanto a questões
econômicas e comerciais, e quanto ao controle sobre as Lojas que,
naquele momento histórico, começam a se multiplicar. Sem dúvida, isto
afastou bastante a Maçonaria dos seus objetivos primeiros.
Diz Christian Jacq (op. cit.. pp. 1
8/1 9): “De fato, no momento em que a Franco-Maçonaria entra na história
sob a forma de uma instituição definida por regulamentos
administrativos, entra também num longo período de decadência em relação
às suas finalidades de origem. A substância de uma ordem iniciatória
é, com efeito, o simbolismo, que dá ao homem a possibilidade de
iniciar-se em espírito; desde que uma Ordem funda sua autoridade sobre
uma legislação temporal em detrimento de qualquer outro fator,
condena-se a se sujeitar às flutuações históricas. A Maçonaria de
1717 esqueceu a máxima medieval. Quando reina o espírito, não há
necessidade de leis".
Em contrapartida, para outros, os
acontecimentos de 1717 (a criação da primeira Grande Loja da
Inglaterra) representam o surgimento esperado de uma Maçonaria que
“finalmente se destaca de um clima manual e inculto, lançando-se aos
cumes do intelecto “. (Christian Jacq, ibidem)
CONCLUSÃO
Jules Boucher (A Simbólica Maçônica, p. 217), citando Qswald Wirth,
destaca que “os Landmarks são de invenção moderna e seus partidários
jamais conseguiram pôr-se de acordo para ,fixá-los“.
“Isso não impede — prossegue ele
— que os anglo-saxões proclamem sagrados esses limites essencialmente
flutuantes, que se ajustam de acordo com seus particularismos. Cada
Grande Loja fixa-os de acordo com seu modo de compreender a Maçonaria;
a Maçonaria é compreendida de modos muito diferentes, razão das
definições contraditórias, destrutivas da unidade dentro de uma
instituição que visa a concórdia universal.”
Entendemos que a profusão de
pronunciamentos dos estudiosos do problema dos Landmarks, via de regra
imprecisos e mesmo contraditórios, impede a sistematização de juízos
válidos no autentico caos em que se mergulhou o assunto.
Nicola Aslan (op. cit., pp. 19/20)
menciona a posição de Virgílio A. Lasca, no seu trabalho “Princípios
Fundamentales de la Orden e los verdaderos Landmarks”, que “não
existe, entre os autores, unidade de critério para a seleção ou
classificação do que eles estimam deverem ser considerados como
Landmarks ou antigos limites. Estes foram estabelecidos recentemente,
depois dos meados do século XIX, e são mais fruto da fantasia, pois os
que deles se ocuparam enumeram-nos em classificações que variam de 3
até 54”.
Aslan (ibidem) transcreve uma relação
de 15 listas de Landmarks conhecidas, elaborada por Virgílio A. Lasca,
que entendemos oportuno citar:
• 3 para Alexander S. Bacon e
Chetwode Crawley;
• 6 para a Grande Loja de Nova York, que toma por base os capítulos
em que se dividem as Constituições de Anderson;
• 7 para Roscoe Pound, a Grande Loja da Virgínia, e o cubano Carlos
F. Betancourt;
• 9 para J. G. Findel;
• 10 para a Grande Loja de New Jersey;
• 12 para A. S. Mac Bride;
• 15 para Jonh W. Simons e para a Grande Loja de Tennessee;
• 17 para Robert Morris;
• 19 para Luke A. Lockwood e a Grande Loja de Connecticut;
• 20 para a Grande Loja Ocidental de Colômbia, com sede em Cali;
• 25 para Albert G. Mackey e Çhalmers I. Paton e ainda a Grande Loja
de Massachussets, a qual, embora só admitindo 8 Landmarks, estes são
iguais àqueles enunciados por Mackey;
• 26 para a Grande Loja de Minnesota;
• 29 para Henrique Lecerff,
• 31 para o Dr. Oliver;
• 54 para H. G. Grant e para a Grande Loja de Kentucky.
Também não passou despercebido para
Aslan (ibidem) o fato de que o tema interessou basicamente, “e quase
que exclusivamente aos maçons da América do Norte”. Diz mais o
estudioso: “Todas essas relações de Landmarks sofreram as mais
severas críticas por parte de escritores autorizados que os estenderam
àqueles que, sob pretexto de tratar dos antigos Landmarks da Ordem,
deixaram a sua fantasia voar. E cada qual considerando Landmark tudo
aquilo que bem quis e entendeu, originou-se desse modo uma grande
perplexidade e uma confusão ainda maior”.
A teoria dos antigos Landmarks da
Ordem, como já vimos, encontrou seus melhores partidários nos Estados
Unidos. Posteriormente, também a Maçonaria da América do Sul passou a
considerá-los, pelo menos até os primeiros anos do século XIX, quando
se intensificaram os movimentos de emancipação das repúblicas atuais
de suas antigas metrópoles. Tais movimentos, surgidos numa seqüência
de fatos históricos iniciados no século XVIII, a partir das revoluções
americana (a Independência dos Estados Unidos, em 1776) e francesa
(1789), consagraram inúmeros “Libertadores”, entre eles Simón Bolívar,
Bernardo O Higgins, José de San Martin e Antonio José de Sucre.
Novamente aqui verificamos a Imita
entre a sociedade tradicional (nobreza estrangeira) e a burguesia
ascendente. Os “libertadores” rechaçavam toda a intervenção
estatal tia vida e nos negócios dos cidadãos, baseando-se no princípio
do laissez-fruire, laissez aller (literalmente, “deixai fazer, deixai
seguir”).
A forma de organização que comumente adotaram os participantes ativos
da luta libertadora ou de emancipação foi no princípio a da
“loja”, que em geral se encontrava integrada na Franco-Maçonaria
internacional, como o caso da Loja Lautaro, que granjeou grande prestígio
e poderio no Cone Sul do continente americano.
O surgimento da Grande Loja da
Inglaterra, em 1717, sob a direção de Anthony Sayer, representou um
dos melhores instrumentos com que contou aquela nação para contribuir
à expansão, para ela imprescindível, de seu mercado, artífice de seu
desenvolvimento econômico.
A ruptura da Maçonaria sul-americana
com a das metrópoles não teria representado uma transgressão a alguns
Landmarks ou regras estabelecidas?
Sem dúvida, a cisão refletiu a
vontade das comunidades sul-americanas, fundada na ambiência social,
econômica e política que vivenciavam; enfim, inspirou-se na realidade.
Dentre as diversas relações de
Landmarks, a mais adotada é a do escritor norte-americano Albert G.
Mackey, contendo uma lista de 25 itens.
Segundo os estudiosos, Machey,
inspirando-se nas noções de história disponíveis à época, cometeu
inúmeros erros, o que reduz a sua lista de Landmarks, apenas e tão
somente, à condição de referência para uma discussão. Aliás,
Nicola Aslan acentua que Mackey, ao longo de seus escritos, censurava a
incrível credulidade de Anderson, ironizando mesmo as suas fantasias,
contidas na suposta história da Maçonaria redigida para constar das
Constituições de 1723.
A contundência de Aslan (op. cit., p.
21) vai ainda mais longe, quando diz que mesmo Mackey “não conseguiu
livrar-se de todo da imaginária narração de Anderson. Acreditou, como
acreditaram todos os seus contemporâneos, na grande antiguidade da Maçonaria,
nas supostas Constituições de York do ano de 926, e em outros fatos
cuja veracidade histórica, somente neste século, ficou estabelecida
pelos historiadores modernos que a negaram“.
Se considerarmos as manifestações
dos seus mais categorizados estudiosos, os franceses não dão nenhuma
importância ao problema dos Landmarks. Boucher (op. cit.. p. 217), com
muita propriedade, afirma que “na Maçonaria francesa, a ‘Liberdade
de Pensamento‘ é um ‘landmark’ fundamental e, paradoxalmente, um
landmark não tem limites!“.
Também Marius Lepage (L’Ordre et
les Obédiences), citado por Aslan refere a questão dos Landmarks de
forma até irônica e agressiva. “Uma única pergunta — diz Lepage
— “Mostrai-me um Landmark, um verdadeiro...“ “Nunca houve, não
há, nunca haverá ‘landmarks’, salvo aqueles redigidos no dia a
dia, segundo as necessidades do momento, por um corpo administrativo
completamente desprovido de conhecimentos e de valor sobre o plano de
iniciação tradicional
A esta altura, parece-nos pertinente a
seguinte indagação: Quando uma Constituição, de qualquer das inúmeras
Obediências hoje existentes, refere a necessidade de serem respeitados
os Landmarks, quais exatamente os que devem ser considerados? Qual das
listas antes referidas deve prevalecer?
Admitir-se a necessidade ou a simples
ocorrência de Landmarks, ou seja, a existência de regras ou preceitos
com características de imutabilidade, é, na verdade, dogmatizar-se
certos enunciados, incorrendo no mesmo erro cometido pela Maçonaria
anglo-saxã, que na sua época, andou na contramão da História,
estabelecendo normas pretensamente irreformáveis e perpétuas, em um
momento histórico em que se buscava a razão das coisas, um momento
“iluminado”.
Constituição e realidade são idéias
que devem andar juntas, pois a primeira qualidade de uma Constituição
é atender à realidade do povo, do grupo, ou da nação a que vai
servir. E a realidade — toda a ambiência social — que fornece a matéria-prima
para a elaboração das normas, das regras de conduta e organização. E
a realidade há de ser alguma coisa de muito profundo, que sobe do
passado para inspirar o presente e projetar-se no futuro.
Concordamos com Nicola Aslan (op.
cit., p. 13), que diz não acreditar “que o problema venha a ter,
algum dia, definitiva solução, se não se resolverem os maçons a
relegar o assunto dos Landmarks ao sótão da Maçonaria, para lá fazer
companhia a muitos outros, hoje considerados como coisas imprestáveis
“.
E para aqueles que condicionam a
unidade da Maçonaria à existência e à aceitação de Landmarks,
utilizamos as afirmações de Jules Boucher (op. cit., p. 2 17): “A
unidade maçônica sonhada por alguns é um engodo; jamais ela será
realizada e nem é desejável que o seja. A Maçonaria deve adaptar-se
aos diferentes países e corresponder, em cada país, às diferentes
aspirações dos maçons. É o simbolismo maçônico bem compreendido o
único que deve formar, o cimento entre todas as Pedras, e é por ele
que a verdadeira Fraternidade pode e deve se estabelecer”. -
Eis aí um desafio para todos nós,
pois não é admissível que entre homens livres e de bons costumes, que
compartilham os mesmos ideais, que adotam práticas ritualísticas
semelhantes, que dividem e guardam os mesmos segredos, enfim, que se
tomam por Irmãos, não se consagre efetivamente o sentido da
Fraternidade, e que existam discriminações.
Afinal, como disse Pitigorsky, “Quem
dá as costas à Luz, só vê a própria sombra“.
Autor do artigo:
Mário Mayerle
CIM 1857 -- ARLS "Fiel Amizade" nº 72 -- Florianópolis
-- SC
Grande Oriente de
Santa Catarina -- GOSC
Editor de O PRUMO
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